quarta-feira, 28 de novembro de 2012

OPINIÕES ALHEIAS


No Momento de Luz de hoje, o irmão X, num conto delicioso, nos apresenta a história de Dona Josefina, médium participante de um grupo espírita.

Com humor que lhe é característico, o Irmão X nos conta a história da pobre Josefina, que sofria a cada crítica recebida, dando uma atenção exacerbada às opiniões alheias.
Portanto, o equilíbrio com o nosso compromisso é a temática do texto.
Esperamos que gostem.
Paz.

 As dificuldades de Dona Josefina Murta eram, indiscutivelmente, bem grandes. Entretanto, se a pobre senhora não encontrava disposição segura para atender às obrigações mediúnicas, é que vivia sempre sob impressões desagradáveis da sensibilidade enfermiça.
Logo que se lhe manifestaram os fenômenos de incorporação, procurou aderir, de boa-vontade, à tarefa, mas não possuía bastante força para resistir às apreciações desfavoráveis.
- Josefina – disse-lhe, certa feita, o marido -, necessita você de melhor educação mediúnica. Deve compreender que o médium sensato pode melhorar o próprio ambiente, em qualquer reunião.
A esposa ouvia, contrafeita, e retrucava:
- Não sei como fazer, Aparício. Nem tudo depende de nós.
- Isto não – tornava o companheiro, conselheiral -, a educação corrige qualquer defeito. As manifestações turbulentas, por seu intermédio, constituem verdadeiro desastre.
Josefina levava o lenço aos olhos para enxugar o pranto de nervosismo. E, abespinhada, entrava em rigoroso silencio.
Depois desse dia, quando voltou novamente à sessão semanal, o presidente da agremiação observou-lhe, em tom confidencial:
- Minha irmã: no instante da recepção de nossos amigos desencarnados, peço-lhe muita atenção. Não se entregue, de maneira absoluta, ao desequilíbrio de nossos irmãos sofredores e perturbados. Controle-se, quanto lhe for possível. Como sabemos, o médium não deve permanecer em extrema passividade. Ainda mesmo nos casos de sonambulismo puro, é imprescindível que o trabalhador sincero esteja vigilante. O tumulto nas sessões desorganiza o serviço espiritual. Espero me releve estas observações. É que me compete o dever de avisá-la em particular.
Dona Josefina, muito corada pela advertência ouvida, agradeceu em palavras entrecortadas de pranto.
Sentou-se, como de costume, à mesa da oração, sentindo-se envergonhada e ferida.
No momento das atividades mediúnicas, porém, absteve-se.
O demônio do medo iniciara a ofensiva. A medianeira das entidades espirituais mobilizou a resistência de que dispunha e permaneceu invulnerável. Terminada a reunião, respondeu às perguntas de Aparício, alegando que, naquela noite, não sentira a menor influenciação.
Longe, no entanto, de estudar os deveres legítimos que lhe cabiam à alma e sem qualquer propósito de desenvolver os valores da cultura e do sentimento, Josefina Murta deixava-se conduzir pela sensibilidade atormentada.
Guardava consigo muitas noções singulares de amor-próprio e cercava-se, na intimidade, de vigorosos preconceitos. Acima de tudo, agastavam-na profundamente qualquer observação que partissem dos outros.
Em razão do ocorrido, não mais se confiou ao trabalho de esclarecimento e consolação das entidades sofredoras.
Continuando, porém, a freqüentar o núcleo espiritista – não só porque o esposo ali recebia valiosa contribuição á saúde, como também por que os seus orientadores invisíveis insistiam pela sua adaptação à tarefa -, certa noite, depois de proveitosa reunião, chamou-a o diretor da casa, sentenciando:
- Dona Josefina, creio que a senhora está reagindo mais do que deve. Lembre sua missão na mediunidade. Em tal serviço, o instrumento não pode entregar-se, de todo, aos Espíritos imperfeitos que nos visitam, mas também não deve negar-se ao trabalho, mantendo-se em extrema atitude de reação. Dê curso à sua tarefa. Não se descuide. Recorde, sobretudo, que o nosso tempo é muito curto na Terra.
A interpelada agradeceu e, na reunião imediata, retomou os afazeres medianímicos. Procurou desenvolver sobre si própria o controle possível. Comunicou-se, através dela, na primeira noite de retorno ao esforço psíquico, uma entidade bem-intencionada, mas em grande perturbação, conversando longamente.
Encerrados os serviços, o Sr. Carvalho Serra esclareceu, irrefletidamente, dirigindo-se à esposa de Aparício:
- Desculpe-me, Dona Josefina, mas na condição de amigo sincero de suas faculdades, cabe-me dizer-lhe que o comunicante desta noite é um grande mistificador. Notei que o patife soube fingir como ninguém. Gesticulou estudadamente e exprimiu-se com indisfarçado fingimento.
A médium registrou um choque doloroso. Ferida no fundo dalma, começou a chorar, convulsivamente.
Dominada pelas impressões alheias, abandonou a mediunidade falante e tentou a psicografia.
A principio, movimentava-se-lhe a mão direita, sem rumo exato, traçando sinais ilegíveis.
O orientador do núcleo, na décima noite de experimentação, endereçou-lhe a palavra amiga:
- Dona Josefina, admito que a senhora deve fazer o possível para auxiliar as entidades que nos visitam. Repare que há dez semanas, precisamente, a senhora apenas recebe garatujas. Suponho que se utilize a intuição, mostrando-se mais receptiva, tudo andaria pelo lado melhor.
A esposa de Aparício orou, pediu o socorro de Jesus e, auxiliada por generosos amigos da espiritualidade, psicografou extensa mensagem na sessão seguinte.
Exultava de contentamento e elevava ardentes agradecimentos a Jesus, quando o diretor da casa tomou as paginas para a leitura em alta voz.
Tratava-se de peça edificante, moldada em princípios evangélicos, exortando os companheiros ao serviço do bem, com humildade e fé. Assinava a pequena epistola devotado mensageiro invisível, da equipe de assistência ao grupo.
Ninguém, todavia, percebeu a essência educativa e consoladora da mensagem. Todos anotavam, antes de tudo, a forma verbalista e o mentor do núcleo se detinha, a cada trecho, para analisar a letra, a ortografia e a construção fraseológica. Finda a leitura, comentou, impiedoso, em tom grave:
- Infelizmente, estas páginas não podem ser do emissário que supostamente as subscreve. O português apresenta numerosas falhas. Aliás, é preciso observar que a nossa irmã Josefina permanece ainda em treinamento mediúnico e semelhantes mistificações são naturais e necessárias.
A pobre dama prorrompeu em soluços, novamente desalentada.
Acalmou-a carinhosamente o esposo:
- Não há razão para tantas lágrimas – disse -, resigne-se querida! Continuemos devotados ao serviço de nossa fé. Dentro de algum tempo, estará você convenientemente preparada e feliz. Não chore assim. Ergamos nossa coragem.
Dona Josefina, no entanto, não conseguiu sofrear o enorme desânimo. Em sua sensibilidade ferida, julgava-se ao desamparo, sem apoio, sem incentivo. Devia, a seu ver, afastar-se dos labores doutrinários para sempre; tantos espinhos a defrontavam na estrada e tantas advertências ouvia, que deliberou interromper o desenvolvimento de ordem psíquica.
Prosseguiu freqüentando invariavelmente o núcleo, em companhia do esposo, mas tornou-se intencionalmente impassível. Sentia a presença dos desencarnados, ouvia-lhes os apelos; contudo, negava-se agora a qualquer colaboração nas atividades de intercambio. A sua mãezinha, que desde muito lhe antecedera os passos ao além-túmulo, implorava-lhe atenção para com os deveres assumidos, destacando a necessidade de paciência e buscando curar-lhe as chagas da sensibilidade doentia. Josefina, porém, fizera-se igualmente surda aos apelos maternos. Afirmava-se cansada de fracassos e desilusões. E, longe de refletir na extensão dos bens que poderia espalhar, intoxicava-se com as migalhas de ignorância que o mundo lhe atirava ao campo de serviço redentor. Declarando-se extremamente ofendida, resistiu a todas as solicitações do esposo e dos mais sinceros amigos.
Trinta anos correram céleres sobre a sua atitude de retraimento e negação, até que a morte lhe requisitou, de novo, o corpo físico.
Num misto de aflição e esperança, entregou-se ao grande transe.
Com inexprimível assombro, porém, verificou, à ultima hora, que sua abnegada mãe se mantinha, em pranto, junto ao leito mortuário...
Preocupada e receosa, desligou-se do veiculo carnal com dificuldade inexprimível e, exausta, abraçou-se à genitora, exclamando, por fim:
- Minha mãe, minha mãe, por que choras? Não é a morte a vida eterna? Não estaremos juntas para sempre?
- Ah! Minha filha – redargüiu a benfeitora, lacrimosa -, venho acariciar-te no limiar da nova vida; entretanto, não te retiraras ainda do mundo!... Não cumpriste a tarefa, junto à família espiritual que o Senhor te confiou...
- Que dizes? – perguntou Josefina, aterrada. 
- Reporto-me ao teu grupo doutrinário, querida filha! O Mestre não nos reúne uns ao outros casualmente. Em cada situação da vida, há um dever mais alto que é necessário cumprir. E agora terás duplicada luta pela ausência do corpo terrestre!...
- Mas, minha mãe – tornou a desencarnada -, não cumpri os meus deveres de esposa, não me dediquei ao marido até ao fim?
A prestimosa mensageira fixou um gesto triste e acentuou:
- Em semelhante setor do aperfeiçoamento, és a obreira plenamente aprovada. No entanto, esqueceste as tuas obrigações de irmã, porque, em verdade, não vieste ao mundo para te embaraçares nas opiniões alheias, e, sim, para realizar a vontade do Senhor, em ti mesma, no serviço aos semelhantes.
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