Quando a sede da Igreja deixou Jerusalém e passou para Roma?
Autor: Pe. Miguel Angel Fuentes
Fonte: Site “Católico Defiende tu Fe” (http://www.catolicodefiendetufe.org)
Tradução: Carlos Martins Nabeto
No que diz respeito à transferência da sede da Igreja de Jerusalém para Roma, o livro dos Atos dos Apóstolos encerra seu relato da atividade de Pedro na Igreja-Mãe de Jerusalém com a seguinte frase enigmática: “e ele foi para outra lugar” (Atos 12,17). O motivo da partida de Pedro não nos é dito, nem para onde ele foi.
Nada pode ser especificamente afirmado sobre os pontos [de parada] ao longo do caminho até Roma, sobre a data da sua chegada à capital do Império ou sobre a duração da sua estadia ali. Por outro lado, é certo que ele participou do Concílio dos Apóstolos em Jerusalém (que deve ser datado pouco após meados do século I) e que, depois, passou algum tempo em Antioquia (cf. Atos 15,7; Gálatas 2,11-14).
O fundamento e o apoio da tradição romana petrina são constituídos por três testemunhos originais, muito próximos cronologicamente, e que somados possuem uma força afirmativa que equivale praticamente à segurança histórica.
O primeiro testemunho tem origem romana e encontra-se na carta que Clemente, em nome da Igreja de Roma, enviou à Igreja de Corinto. Clemente passa a falar, no capítulo 5, de casos recentes em que cristãos, “por motivo de inveja”, sofreram tormentos e até morte; entre eles destacam-se Pedro e Paulo:
“Pedro que, por emulação perversa, teve que suportar, não um ou dois, mas muito mais trabalhos e, dessa maneira, após dar seu testemunho, foi para o lugar de glória que lhe era devido”.
Com Pedro, uma grande multidão de “eleitos” sofreu o martírio, inclusive mulheres cristãs, que foram executadas vestidas como Danaides e Dirces. Trata-se de uma alusão à perseguição de Nero e isso nos permite verificar a morte de Pedro e apontá-la cronologicamente em meados dos anos 60 d.C. Clemente não fornece dados sobre a forma e o local da execução; na verdade, o seu silêncio sobre os detalhes faz supor que os seus leitores, evidentemente, conheciam os eventos. Para o próprio Clemente, eram fatos passados no local em que residia e em seus dias (na sua geração); constituíam-lhe, sem dúvida, [fatos] pessoalmente familiares.
O fundo essencial desse testemunho também é encontrado numa carta que, cerca de 20 anos depois, foi endereçada do Oriente para a Igreja de Roma: Inácio de Antioquia, Bispo da Igreja gentílica de mais rica tradição, que podia mais do que qualquer outra estar informada sobre a vida e a morte dos Apóstolos, implora aos cristãos de Roma que não o privem do sofrimento do martírio, intercedendo perante as autoridades romanas. Inácio esclarece seu pedido com a respeitosa frase:
“Eu não mando em vós como Pedro e Paulo”.
Com efeito, estes [Apóstolos] tiveram algum dia um [forte] relacionamento com a Igreja de Roma, a qual lhes conferiu uma posição de autoridade, ou seja, eles permaneceram lá como membros ativos da comunidade, não transitoriamente como visitantes casuais. O peso deste testemunho encontra-se no fato de que uma declaração do Extremo Oriente cristão confirma inequivocamente o que a Igreja Romana sabe acerca da permanência de Pedro nela.
Ao lado da carta inaciana aos romanos, nos é oferecido ainda um terceiro documento, que testemunha a favor da estada e do martírio de Pedro em Roma: a “Ascensio Isaiae” (4.2s), cuja redação cristã data de cerca do ano 100. Ela fala, em estilo de anúncio profético, que a plantação dos Doze Apóstolos será perseguida por Beliar, o “assassino de sua mãe” (=Nero), e um dos Doze será entregue nas suas mãos. Essa profecia é esclarecida por um fragmento do “Apocalipse de Pedro”, que também deve ser datado do início do século II. Aqui é dito:
“Eis, Pedro, que Eu te revelei e expus tudo para ti. Põe-te a caminho da cidade da prostituição, e bebe do cálice que Eu te anunciei”.
Esses textos combinados – que provam conhecer o martírio de Pedro em Roma sob Nero -, confirmam e ressaltam consideravelmente a segurança da tradição romana.
A esses três testemunhos fundamentais, são acrescentadas duas alusões [bíblicas] que complementam o quadro da tradição petrina:
– O autor do último capítulo do Evangelho de João alude claramente à morte de Pedro pelo martírio e claramente sabe que ele foi executado na cruz (cf. João 21,18), embora permaneça calado sobre o lugar do martírio.
– Por outro lado, nos versículos finais da primeira carta de Pedro, Roma é designada como seu local de residência, já que afirma que a carta foi escrita na “Babilônia”. Pois bem, por “Babilônia” devemos entender “Roma”, conforme sugerido pela equação “Roma-Babilônia” do Apocalipse de João (14,8.16 e seguintes) e da literatura judaica apocalíptica e rabínica.
A tradição petrina romana não é quebrada no decorrer do século II e é amplamente atestada pelos testemunhos dos mais variados territórios pelos quais o Cristianismo se expandiu: no leste, por Dionisio de Corinto; no oeste, por Irineu de Lião; e na África, por Tertuliano.
Mais importante ainda é o fato de que não há nenhuma outra igreja cristã que reivindique tal tradição para si, e nem sequer uma voz contemporânea se ergue para combatê-la ou questioná-la. Essa ausência quase surpreendente, de qualquer outra tradição concorrente, deve certamente ser considerada como fator decisivo no exame crítico da tradição romana.
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