terça-feira, 7 de julho de 2015

EM BUSCA DE NOVAS VERDADES


Madalena retorna esta semana, ao Momento de Luz, para propor uma reflexão: O que somos sem nossas verdades? Negando-as, podemos deixar de existir?

A partir de um diálogo entre Madalena e Gregório, poderemos refletir sobre a essência humana que se mantém mesmo após a morte. Donos de verdades absolutas e temendo o desconhecido, muitas vezes optamos por permanecer no mesmo lugar, que mesmo causando-nos dor e sofrimento, parece-nos mais seguro.

Que tal aproveitar a companhia destes dois amigos e buscar novas verdades, novos caminhos, novas formas de pensar, sentir, agir.


Certo dia, encontramo-nos no jardim, perto da fonte de água e luz. Sempre foi meu lugar preferido. É lindo! A água jorra com tanta força que gera música e, sob sol, transmite luz. Gosto de sentar perto, mas não bem em frente, porque devido ao grande número de visitantes sempre há um burburinho. Fico afastada à medida que dê para contemplar, ao mesmo tempo em que possa divagar em meus pensamentos.

Foi lá que eu e Gregório marcamos nossa primeira “entrevista”. Sim, naquela manhã, ele era o repórter e eu a entrevistada. Prometi-lhe contar sobre a minha vida ou parte dela, pois que, uma vida divide-se em muitas outras existências.

Chegou esbaforido, contrastando com a calmaria do local, embora estivesse repleto de contempladores e curiosos. Sentou-se ao meu lado, enxugando o suor que escorria pelo rosto. Parecia um repórter policial. Empolguei-me. Seria a minha primeira entrevista.

Cumprimentou-me educadamente. Pegou o bloco e, antes que começasse a questionar-me, explicou-se: “Desculpe-me. Foi uma noite difícil. Não preguei o olho. Muitos chegaram à noite passada, e fui incumbido de dar as boas-vindas a dois velhos amigos que foram resgatados das zonas abissais.”

Como poderia responder se somente pensava em perguntar? Interrompi o início da sua primeira questão: “Você é que vai me desculpar, mas nada responderei até saber, com detalhes, o que ocorreu ontem”.

Gregório sorriu, reconhecendo a própria curiosidade. Acho que por isso nem argumentou. “Está bem! Vou contar-lhe o que vivi na noite passada. ” Tomei o bloco de suas mãos e comecei a tomar nota.

Balançando a cabeça enquanto sorria, começou: “Ontem, houve uma operação de resgate. Foi um grupo grande. Já estavam sendo acompanhados há alguns meses. Foi um trabalho duro que terminou com êxito, embora muitos não tenham conseguido alcançar o objetivo da salvação, desistindo de vir com o grupo na última hora”.

“Como assim? ”, questionei curiosa. “Soube que há muita dor e sofrimento nas zonas abissais. Por que optaram por ficar? Não compreendo”.

“Não compreendemos muitas coisas que passam pela cabeça e pelo coração humano, respondeu Gregório. É difícil compreender que possamos nos acostumar com a dor e o sofrimento, e temamos a correção das vicissitudes que vivemos por não saber o que fazer depois. Inseguros, eles optaram pelo conhecido, temendo não dar conta do que desconhecem”.

“Ainda não ficou claro para mim”, insisti ainda confusa.

Gregório tentou explicar-me: “O grupo de resgate inicia o trabalho fazendo visitas regulares que vão ficando cada vez mais freqüentes. Oferecem alimento, água e cobertor. Depois, mais próximos, oferecem escuta e acolhimento. Por fim, resgatam aqueles que escolhem sair das trevas para viver na luz, não antes de explicar-lhes que mudar de ares significa mudar de hábitos. Não dá para viver na obscuridade do outro lado, é preciso se fazer luz. E diante de tal pressuposto, muitos desistem, acreditando que não serão capazes de deixar para trás algo que creem fazer parte deles”.

“Os dois amigos que fui receber também pensavam assim”, continuou. “Fui chamado às pressas para contribuir com o grupo de resgate que se esforça para não perder nenhum espírito com potencial de ser resgatado. Foi difícil! Primeiro, eles não me reconheceram. Depois, não acreditavam no que eu dizia. Duvidaram da vida que descrevia para eles”.

“Fiquei aturdido! Como a verdade parece mentira mesmo para aqueles acostumados a investigá-la. Eram escritores como eu. Buscavam a verdade. Queriam que ela fosse propagada a qualquer custo, não importasse as consequências. E naquele momento, preferiam internalizar o que tinham como único caminho, temendo a boa nova que eu os apresentava”.

“Somos assim: um tantinho de coragem diante da contraposição das nossas verdades. O que somos sem elas? Por isso a defendemos a qualquer custo, mesmo diante da dor e do sofrimento. Optamos por não confrontá-las. Tememos negar-nos para percorrer outros caminhos”.

“Eles não admitiam a vida após a morte. Parece ser ilógico, mas é fato. Preferiam crer estar vivenciando um pesadelo, uma tortura política, uma prisão... E, apelando para o senso crítico e investigativo que os compunham, consegui convencê-los a investigar a minha verdade, oferecendo a possibilidade de pesquisa e de confrontar as velhas e novas verdades”.

Sua fala calou-me. Fiquei tentando entender a essência humana que foge das verdades, temendo deixar de existir. Pensei em mim, nas minhas verdades. No que tinha preparado para contar a Gregório. Será que podia ser diferente? E se fosse o que seria ou teria sido de mim?

Gregório também se calou. O que estaria pensando? Percebi que lágrimas rolavam por sua face. Não tive coragem de perguntar mais nada. Arranquei as páginas que escrevi, dobrei-as e guardei-as. Fechei o bloco e deixei ao seu lado. Levantei-me e resolvi caminhar. Nada precisei dizer. Ambos sabíamos que precisávamos ficar sozinhos. Precisávamos de tempo para pensar. Olhei mais uma vez para a fonte de água e optei por algo novo: caminhar.

Salve Deus

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