Por Alessandro Lima
Desde os tempos apostólicos a Igreja ensina que os que morreram na amizade do Senhor, não só podem como estão orando pela salvação daqueles que ainda se encontram na terra. Tal conceito é conhecido como a intercessão dos santos.
A Doutrina
Sobre a doutrina da intercessão dos santos, o Catecismo da Igreja Católica ensina:
“Pelo fato que os do céu estão mais intimamente unidos com Cristo, consolidam mais firmemente a toda a Igreja na santidade… Não deixam de interceder por nós ante o Pai. Apresentam por meio do único Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, os méritos que adquiriram na terra… Sua solicitude fraterna ajuda, pois, muito a nossa debilidade.” (CIC 956)
Por tanto para a Igreja Católica, os santos intercedem por nós junto ao Pai, não pelos seus méritos, mas pelos méritos de Cristo Nosso Senhor, o único Mediador entre Deus e os homens.
A Intercessão dos Justos no Antigo Testamento
Deus manda Abimelec pedir as orações de Abraão por ele:
“Agora, pois, restituí a mulher a seu marido [Abraão] porque é profeta e rogará por ti, para que vivias” (Gn 20,7).
O povo de Israel pede as orações de Samuel:
“Roga ao Senhor, teu Deus, pelos seus servos, para que não morramos” (1Rs 12,19).
O Rei Joroboão pediu a intercessão de um justo:
“Então disse o rei ao homem de Deus: ‘Aplaca o Senhor, teu Deus, e roga por mim para que me seja restituída a mão’. O homem de Deus aplacou o Senhor e o rei pôde trazer de novo a si a mão, que se tornou tal como era antes.” (1 Rs 13,6).
Ozias pede a intercessão de Judite:
“Agora, pois, ora por nós, porque tu és uma mulher santa e temente a Deus” (Jdt 8,29).
Disse Deus aos amigos de Jó:
“Tomai, pois, sete touros e sete carneiros e vinde ter com meu servo Jó. Oferecei-os por vós em holocausto e meu servo Jó intercederá por vós. É em consideração a ele que não vos infligirei ignomínias por não terdes falado bem de mim, como Jó, meu servo” (Jo 42,8).
Como se vê é o próprio Deus que recomenda que oremos uns pelos outros.
Com efeito, ensinou também o Apóstolo Paulo:
“Nas contínuas orações que por vós fazemos, damos graças a Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo” (Col 1,3).
Jesus mesmo ensinou:
“Orai pelos que vos perseguem e caluniam” (Mt 5,44).
São Tiago ensinou:
“Orai uns pelos outros, para serdes salvos, porque a oração do justo, sendo fervorosa, pode muito” (Tg 5,16).
Tudo isso demonstra que Deus aceita a oração dos justos por nós.
Os Santos defuntos podem orar por nós
Alguém ainda poderia objetar: os exemplos até aqui são de vivos pedindo a oração de vivos e não de vivos pedindo a oração de mortos.
Primeiro, os justos que morreram na amizade de Deus estão vivos e não mortos.
É o próprio Cristo que o afirma:
“Ora, Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos; porque todos vivem para ele” (Lc 20,38).
Com efeito, os evangelhos relatam a presença de Moisés e Elias com Jesus no monte das oliveiras durante a sua transfiguração.
Em Jeremias lemos:
“E o Senhor disse-me: Ainda que Moisés e Samuel se pusessem diante de mim, a minha alma não se inclinaria para este povo; tira-os da minha face e retirem-se” (Jer 15,1).
No tempo do Profeta Jeremias ambos Moisés e Samuel já estavam falecidos. O texto bíblico ficaria totalmente sem sentido se os dois servos de Deus não estivessem vivos no mundo espiritual e se não pudessem interceder pelos que estão na terra. Em 1 Sm 28,14 temos mais uma evidência de que o Profeta Samuel estava muito vivo, apesar de falecido.
No Segundo Livro dos Macabeus também lemos:
“Este é o amador dos seus irmãos e do povo de Israel; este é Jeremias, profeta de Deus que ora muito pelo povo e pela santa cidade” (2 Mac 15,12-14).
Não só os santos defuntos rezam pelos que ainda vivem na terra, como também os santos anjos.
Em Zac 1,12-13 um anjo intercede a Deus por Jerusalém e várias cidades de Judá.
O arcanjo Rafael diz a Tobias:
“Quando rezavas com lágrimas, e sepultavas os mortos eu oferecia tua oração a Deus” (Tob 7,12).
Nosso Senhor Jesus Cristo, na parábola do Rico e Lázaro (Lc 16:19-31), nos mostra que mesmo após a morte o Rico (que estava no inferno) pede a intercessão de Abraão (que estava no céu), pelos seus parentes. Jesus não contaria esta parábola se os santos que morreram na esperança do Senhor, não pudessem rogar pelos vivos.
A comunhão dos Santos
O Apóstolo Paulo ensina que todos os fiéis cristãos estão unidos entre si como membros do corpo único de Cristo (cf. 1Coríntios 12,12-27), onde Nosso Senhor é a cabeça e nós seus membros:
“Mas, pela prática sincera da caridade, cresçamos em todos os sentidos, naquele que é a cabeça, Cristo. É por ele que todo o corpo – coordenado e unido por conexões que estão ao seu dispor, trabalhando cada um conforme a atividade que lhe é própria – efetua esse crescimento, visando a sua plena edificação na caridade” (Efésios 4,15-16).
Ora, estando Cristo no Céu e sendo a cabeça da Igreja, isso mostra que os fiéis defuntos também fazem parte do mesmo corpo místico de Nosso Senhor. Todos os fiéis sejam eles vivos ou mortos fazem parte do mesmo corpo, que é a Igreja, cuja cabeça é Jesus.
Logo, se todos somos membros do mesmo corpo místico, estamos unidos. E todos os bens e virtudes que um membro tem ou ganha pode ser comunicado a outro, assim como ocorre no corpo. Isso obviamente inclui as orações.
O livro do apocalipse é o livro que mais detalha o serviço que os Santos prestam a Deus. Eles se ocupam na oração (cf. Ap 5,8). Mas por que será que eles oram? Oram por nós que ainda estamos na caminhada.
Encontramos também a seguinte passagem:
“Quando abriu o quinto selo, vi sob o altar as vidas dos que tinham sido imolados por causa da Palavra de Deus e do testemunho que dela tinham prestado. E eles clamaram em alta voz: ‘Até quando, ó Senhor santo e verdadeiro, tardarás a fazer justiça, vingando nosso sangue contra os habitantes da terra?’ ” (Ap 6,9-10).
Os Santos estão pedindo por justiça e podem faze-lo porque estão na presença de Deus.
E não só podem orar, como oram e oferecem suas orações a Deus:
“Outro Anjo veio prostrar-se junto ao altar, com um turíbulo de ouro. Deram-lhe uma grande quantidade de incenso para que o oferecesse com as orações de todos os santos, sobre o altar de outro que está diante do trono.” (Ap 8,3).
O Apóstolo Paulo após referir-se aos Santos Mártires e Heróis na Fé do Antigo Israel (cf. Hb 11), logo em seguida diz que somos assistidos por eles e que são uma multidão de testemunhas nossas (cf. Hb 12,1).
Ora, o texto Paulino não faria qualquer sentido se não existisse a comunhão dos santos, isto é, a união mística dos fiéis vivos e defuntos num único organismo vivo que é a Igreja, corpo místico de Nosso Senhor Jesus Cristo.
O Testemunho dos primeiros cristãos
Vejamos agora o que professava os cristãos no tempo em que não havia divisão na Cristandade, em relação à doutrina da intercessão dos santos:
“O Pontífice [o Papa] não é o único a se unir aos orantes. Os anjos e as almas dos juntos também se unem a eles na oração” (Orígenes, 185-254 d.C. Da Oração).
“Se um de nós partir primeiro deste mundo, não cessem as nossa orações pelos irmãos” (Cipriano de Cartago, 200-258 d.C. Epístola 57)
“Aos que fizeram tudo o que tiveram ao seu alcance para permanecer fiéis, não lhes faltará, nem a guarda dos anjos nem a proteção dos santos“. (Santo Hilário de Poitiers, 310-367 d.C).
“Comemoramos os que adormeceram no Senhor antes de nós: patriarcas, profetas, Apóstolos e mártires, para que Deus, por suas intercessões e orações, se digne receber as nossas.” (São Cirilo de Jerusalém, 315-386 d.C. Catequeses Mistagógicas).
“Em seguida (na Oração Eucarística), mencionamos os que já partiram: primeiro os patricarcas, profetas, apóstolos e mártires, para que Deus, em virtude de suas preces e intercessões, receba nossa oração” (São Cirilo de Jerusalém, 315-386 d.C. Catequeses Mistagógicas).
“Se os Apóstolos e mártires, enquanto estavam em sua carne mortal, e ainda necessitados de cuidar de si, ainda podiam orar pelos outros, muito mais agora que já receberam a coroa de suas vitórias e triunfos. Moisés, um só homem, alcançou de Deus o perdão para 600 mil homens armados; e Estevão, para seus perseguidores. Serão menos poderosos agora que reinam com Cristo? São Paulo diz que com suas orações salvara a vida de 276 homens, que seguiam com ele no navio [naufrágio na ilha de Malta]. E depois de sua morte, cessará sua boca e não pronunciará uma só palavra em favor daqueles que no mundo, por seu intermédio, creram no Evangelho?” (São Jerônimo, 340-420 d.C, Adv. Vigil. 6).
“Portanto, como bem sabem os fiéis, a disciplina eclesiástica prescreve que, quando se mencionam os mártires nesse lugar durante a celebração eucarística, não se reza por eles, mas pelos outros defuntos que também aí se comemoram. Não é conveniente orar por um mátir, pois somos nós que devemos encomendar suas orações” (Santo Agostinho, 391-430 d.C. Sermão 159,1)
“Não deixemos parecer para nós pouca coisa; que sejamos membros do mesmo corpo que elas (Santa Perpétua e Santa Felicidade) (…) Nós nos maravilhamos com elas, elas sentem compaixão de nós. Nós nos alegramos por elas, elas oram por nós (…) Contudo, nós todos servimos um só Senhor, seguimos um só Mestre, atendemos um só Rei. Estamos unidos a uma Cabeça; nos dirigimos a uma Jerusalém; seguimos após um amor, envolvendo uma unidade” (Santo Agostinho, 391-430 d.C. Sermão 280,6)
“Por vezes, é a intercessão dos santos que alcança o perdão das nossas faltas [1Jo 5,16; Tg 5,14-15] ou ainda a misericórdia e a fé” (São João Cassiano. 360-435 d.C. conferência 20).
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