quarta-feira, 3 de junho de 2020

Virgem Panaghia Tsambika


O ícone da Virgem Panaghia Tsambika


Autor: Página Teologia Mística das Igrejas do Oriente no Facebook
Fonte: excerto do artigo: “A Cultura Viva e a Missão Mística de Maria na Cristandade Oriental” (publicado em Novembro de 2018, Universidade de Basiléia, Suíça)

O ícone da Virgem Panaghia Tsambika é provavelmente o ícone mais venerado de Maria na ilha de Rodes (Grécia), e é conhecido por muitos Ortodoxos em todo o mundo. Tsambika deriva de tsamba, “uma cintilação de luz”, uma referência à forma como o ícone foi encontrado no topo da montanha há séculos, e onde mais tarde foi construída uma pequena igreja. De acordo com a tradição, este ícone é muito milagroso, a maioria dos milagres referem-se às mulheres estéreis que suplicam à Mãe de Deus que lhes conceda um filho. A história mais conhecida é a respeito da mulher de um turco, Paxá muçulmano (de quando a Grécia fazia parte do Império Otomano), que não conseguia conceber um filho. Ela rezou para o ícone e engoliu o pequeno pavio que estava queimando na lamparina do ícone. Ela concebeu, mas o Paxá não acreditava que a criança fosse dele, nem que um milagre tivesse acontecido. No entanto, ao nascer, a criança trazia na mão o pavio da lamparina da Virgem. Em agradecimento, o Paxá doou então todas as terras que agora rodeiam a igreja. Ainda hoje, o uso comum do ícone é feito principalmente por mulheres que não conseguem conceber e que rezam por uma intervenção divina. Os visitantes sobem centenas de degraus para chegarem à igreja “de Cima”, uma ligação metafórica com Maria que é referida como “escada sagrada”.

O original Tsambika é um ícone em prata que retrata Maria na postura orans (orante) com suas mãos estendidas, e Cristo como uma criança em posição orans semelhante em seu peito e ventre. Este estilo antigo de iconografia é frequentemente chamado de Platytera, que pode ser traduzido como “mais amplo” ou “mais espaçoso”, indicando Maria como a portadora do Criador do universo. Há uma imensidão de outros ícones marianos que são escritos com este estilo. Na Igreja Eslava, este tipo de ícone é referido como a Virgem do Sinal (Znamenie). Este estilo metaforicamente retrata Jesus no ventre da Virgem, apontando para o mistério da encarnação em que Maria, como vaso sagrado, contém o incontenível. No entanto, no ícone Tsambika, as mãos de Maria não só se estendem em oração, mas também são representadas na forma de um abraço. Ela abraça o Deus não-abraçável, o menino Jesus, e assim toda a humanidade. O abraço é tão evidente que a paróquia de Taxiarches e Panaghia Tsambika da Metrópole de Rodes metaforicamente “acolhe [os visitantes] nos braços de Panaghia (Santíssima)”.

O mosteiro de Tsambika recebe milhares de visitantes de toda a Grécia e de países da Europa Oriental, coração da Ortodoxia, mas também de contextos diáspóricos e minoritários (como a França, a Bélgica e a Finlândia). Um livro de visitas na igreja “de Cima” está cheio de orações manuscritas, palavras de gratidão e hinos devocionais, expressos em diferentes formas e línguas por várias pessoas. Numerosos bonecos de cera [ex-votos] são colocados debaixo do ícone na esperança de uma intervenção divina, assim como fotos de crianças como testemunho e gratidão pela intervenção de Maria. Muitas mulheres locais dão aos seus filhos o nome de Tsambika em agradecimento à Virgem por sua ajuda divina na concepção. A Mãe de Deus Tsambika é tratada pelas mulheres como uma mulher que compreende e abraça a dor e a alegria de uma mãe, mas também como a Mãe de Deus que divinamente permite experiências maternas. Neste sentido, a natureza arquetípica do ícone Tsambika está em seu carácter de vaso do feminino que abriga o nascituro bem como protege o nascido. Tais funções de conter e abrigar se sobrepõem e são representadas por imagens arquetípicas como ninho, berço, cama, navio, cabana, casa, caverna, templo, montanha, treliça, muro, véu. Muitas destas imagens encontram-se em outros ícones marianos, por exemplo no “Intercessão da Theotokos” (como o véu protetor) ou no “Parede Inquebrável”. O significado arquetípico de conter, abrigar e proteger vai além das experiências de nascimento ou maternidade encarnada. Alguns teólogos ortodoxos veem Maria como “o arquétipo da humanidade”. Maria é a representação arquetípica de toda a humanidade. O mistério de conter Deus e dar à luz Deus dentro de si mesmo é igualmente importante para homens e mulheres. Como disse um sacerdote enquanto pregava em um ofício litúrgico durante o nosso trabalho de campo:
“Maria é um exemplo para nós, um exemplo para dar à luz ao amor e as pequenas boas ações… barbados ou não, altos ou baixos, homens ou mulheres, grávidos ou não, todos podemos dar à luz ao amor”.

Neste estado de espírito, também os homens são esotérica e metaforicamente inspirados a estarem “grávidos” e darem à luz Deus. Segundo Gregório Palamas, a Virgem foi o único ser humano que — devido às suas qualidades e pureza — foi capaz de conter o espírito imortal que excede os domínios humanos e, portanto, dar à luz o Deus Eterno. O famoso kontákion (uma forma de hino) da Natividade, divinamente inspirado e composto por Romanós o Melode no século VI e agora cantado durante o Natal, glorifica poeticamente como “a Virgem dá à luz ao Suprasubstancial” (“Aquele que é anterior à substância” em grego antigo ou eslavo eclesiástico), “o Inacessível”, “o Deus Eterno””. É por isso que no Cristianismo Ortodoxo, Maria é maioritariamente referida como a Portadora de Deus (Theotokos, em grego), A Dadora de Deus (Bogoroditse, em eslavo eclesiástico) ou a Mãe de Deus (Bozhja Mater, em eslavo eclesiástico).

O ícone Tsambika (semelhante a outros ícones marianos Platytera, ou do Sinal) simboliza o barco sagrado que encarna o mistério de conter e dar à luz. Claro que o seu aspecto literal é a ajuda na concepção ou no nascimento. Mas a missão de Maria aqui também está no ato de conter o Deus Eterno e no ato do nascimento de Deus, a missão que inspira a transformação espiritual interior. Isto é evidente para alguns fiéis que visitaram ou rezaram ao ícone, como descobrimos em nossa etnografia. Nas orações matinais, há referências poéticas à Mãe de Deus como aquela que contém o Deus Eterno e possibilita experiências espirituais relacionadas entre as pessoas.

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