terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Vale Do Amanhecer

Vale Do Amanhecer: que doutrina é essa?

Um texto para desmistificar o que você pensava sobre o Vale sem de fato conhecê-lo
publicado 
Se você já ouviu falar do Vale do Amanhecer, já deve ter ouvido algumas opiniões sobre o local e o que acontece por lá. Mas só ouvir falar, sem nunca ter ido, ou nunca ter lido um material embasado do assunto pode te dar uma visão enviesada sobre o Vale e cá entre nós, este é um lugar que vale muito a pena entender, mesmo que só para aumentar os seus conhecimentos sobre diferentes doutrinas. A sugestão aqui é abrir seu coração e ler sobre o que descobrimos indo ao Vale do Amanhecer.
Pra começar, é importante saber que ele fica localizado no coração do Brasil, no Distrito Federal, mais especificamente, a seis quilômetros de Planaltina. O Vale é um complexo religioso onde a Doutrina do Amanhecer se desenvolveu. Muito mais que uma localidade, Vale do Amanhecer nomeia uma Doutrina, baseada no Cristianismo, e que possui princípios fundamentados no Evangelho, além de apresentar um forte sincretismo religioso, devido às referências trazidas de várias civilizações, de um período de tempo de mais de 2000 anos.

1. Mas como surgiu a Doutrina?

Na foto abaixo está a principal responsável pelo desenvolvimento da Doutrina, Neiva Chaves Zelaya, a Tia Neiva. E ninguém melhor para contar a história dela que um seguidor que professa a fé do Vale desde os nove anos de idade, o Diogenes Borba, 36, explica que a Tia Neiva foi a grande semeadora da Doutrina, hoje disseminada por todo Brasil e em outros países do mundo.
"A Tia Neiva era Católica Apostólica Romana, praticante com orgulho. Em certo momento ela começou a ter visões de espíritos. Na cabeça dela eram pessoas, com quem ela conversava normalmente. Pessoas que ninguém mais via. Na verdade eram os espíritos, porém ela não tinha esse esclarecimento". Foi um momento em que a vida da Tia Neiva mudou drasticamente. Ela quase se convenceu de que era louca, porque além das visões, ela passou a ter previsões sobre coisas que iriam acontecer. Ela ainda não tinha o entendimento de que era Clarividente, mas, depois de dois anos de turbulência, ela aprendeu a lidar com as visões e tudo se esclareceu. 


Desde então, a Doutrina começou a ser idealizada. Diogenes explica que a Tia Neiva "viu" a Doutrina do Vale em outra dimensão, a partir do contato com o mundo espiritual, e a projetou para o nosso mundo. "E tudo aqui surgiu a partir dessas visões da Tia Neiva".

2. Mas afinal, qual a missão dessa doutrina?

A missão da Doutrina é colocar Jesus no coração, é dar assistência espiritual às pessoas que a procuram. Totalmente acolhedora, a Doutrina trata de pessoas com problemas predominantemente mediúnicos, sem distingui-las pela cor, condição econômica ou credo.
"As pessoas que nos procuram costumam apresentar alguns problemas espirituais, como possessões, visões, audição de vozes, problemas que prejudicam o espiritual e o físico de cada pessoa." Os médiuns são pessoas que se colocam no estado de harmonia, de ligação com o mundo espiritual e, a partir daí, se tornam instrumentos de manipulação de energias, resultando em benefícios para aqueles que procuram a Doutrina, dos quais podemos destacar a harmonia, a calma, a cura, o encontro consigo mesmo.

3. Como funcionam os atendimentos?

Falar dos atendimentos espirituais é também falar da mediunidade, dos rituais, da simbologia da Doutrina, dos templos do Vale e implica em caminhar nos caminhos de Deus. Sem dúvida, a Doutrina apresenta um rico sincretismo religioso, que infelizmente não caberá a esta matéria explicá-lo totalmente.
Para a Doutrina cada pessoa é um médium, porém, algumas pessoas não compreendem ou apresentam alguma dificuldade para desenvolver a mediunidade. Ela é essencial nos atendimentos e rituais realizados nos templos e demais localidades do Vale. O Vale, por sua vez, possui uma estrutura física específica e projetada para a prática da Doutrina. Ao longe de sua entrada, já é possível visualizar o morro "Salve Deus", com tais dizeres amplamente escritos em sua superfície. Abaixo dele, se encontram a Pirâmide, o Lago de Yemanjá, os Quadrantes e a Estrela Candente, locais onde são realizadas cerimônias para beneficiar o coletivo, auxiliar a humanidade.
Há ainda o Templo-Mãe, o local onde tudo começou, o templo principal onde são realizados rituais e atendimentos. Feito de pedra, o Templo foi o sétimo e o último construído, ainda na época em que Tia Neiva vivia neste mundo. Ele é composto por várias salas, cada uma delas para finalidades distintas. Como exemplo, há o "Castelo do Silêncio", um local de preparação e concentração para antes das cerimônias. E são em algumas dessas salas que ocorrem os atendimentos, de acordo com cada problema apresentado pelo visitante.
A entrevista com o Diogenes ocorreu no Templo-Mãe em uma terça-feira pela manhã, em que são realizadas duas cerimônias. Ele explica que para cada dia da semana e turno são realizadas cerimônias distintas. Na terça feira, por exemplo, foi possível presenciar a Mesa Evangélica, uma cerimônia voltada para a dominação de espíritos negativos."Toda vez que temos contato com um espírito negativo, a gente busca colocá-lo no caminho de Deus, no caminho cristão, de amor e perdão", diz.

4. E o que representam os símbolos do Vale?

É impossível falar do Vale sem citar os símbolos que compõem essa Doutrina. Devido ao forte sincretismo religioso, existem influências indígenas, caboclas, dos Incas, entre outros. Aqui você conhecerá uma pequena amostragem desses símbolos e os seus significados.

As Cores

Presentes em tudo, as cores estão ligadas às questões energéticas. Ao entrar no Templo-Mãe é possível identificar o forte colorido nas paredes de pedra, nos assentos, nos tecidos, nos altares, colorido que também se estende ao vestuário dos fiéis. O Diogenes explicou o significado de algumas cores: verde é a energia das matas; o amarelo está voltado para o conhecimento, sabedoria; o lilás simboliza a cura; o branco a paz; o marrom está ligado ao São Francisco de Assis, uma das reencarnações do Pai Seta Branca, líder dos fiéis da Doutrina.
Em relação as vestimentas, a roupa branca é destinada à quem se inicia na Doutrina, mas a cor acompanha o medium por toda a vida. As mulheres usam um vestido branco e os homens apenas a camisa com a calça preta. Os fiéis que se encontram em um nível mais intermediário vestem o jaguar, uma roupa que caracteriza a calça marrom e a camisa preta nos homens, e a saia marron e a camisa preta nas mulheres. Quando os fiéis são, como diz Diogenes, "veteranos" eles usam uma capa colorida para acompanhar a vestimenta jaguar, cada cor de capa é um nivel diferente. O crescimento do fiel em níveis dependerá de seu compromisso espiritual, que é assumido antes mesmo da pessoa encarnar, antes mesmo dela nascer, além de sua dedicação à Doutrina.

Pai Seta Branca

O Pai Seta Branca é uma das reencarnações de São Francisco de Assis. Ele, juntamente com a Mãe Iara - que no catolicismo seria a Santa Clara de Assis - formam o casal principal responsável pela Doutrina. Pai Seta Branca é representado como índio porque foi assim que ele apareceu para a Tia Neiva. Ele chefiava um exército dos índios e conquistou admiração por usar a força como último recurso. A seta branca em suas mãos deve-se ao seu status de Cacique Tupinambá e significa a pureza.

Demais símbolos

Demais símbolos

Jaguar: é o símbolo que vem do portal do sol dos Incas. A frente do Templo é inspirada nesse portal. Esse símbolo é representado por um leão de juba colorida que também expressa a encarnação do Pai Seta Branca como o "Grande Jaguar".
Cruz: A cruz é o símbolo do cristianismo, cujo pano branco simboliza o manto que cobriu o corpo de Cristo quando ele foi descido da cruz. É o símbolo do Doutrinador (médium).
Triângulo: É o símbolo do médium de incorporação, que manifesta um espírito de forma semi-consciente, mas não tem o controle de sua fala e do gestual, ficando a cargo do espírito manifestado. A cor vermelha do triângulo simboliza a cura desobsessiva e, dentro dele, o livro corresponde ao Santo Evangelho.
Estrela de seis pontas: Na Doutrina, simboliza dois triângulos equiláteros sobrepostos de forma invertida. O vértice voltado para cima simboliza a evolução, que se direciona ao paraíso; o vértice voltado para baixo simboliza a involução, este mundo no qual vivemos.
Sol e Lua: Ambos simbolizam a unificação de forças opostas e complementares: o sol seria um pólo positivo e a lua um pólo negativo, equilibrando assim o magnetismo da Terra.

5. E quem são os seguidores da doutrina?

Agora que já foi possível conhecer alguns aspectos sobre o templo e seus rituais, é importante também conhecer um pouco das pessoas que juntas levam essa Doutrina em diante.

Maria Clara

Nascida já na Doutrina, Maria Clara, como preferiu ser identificada, 17 anos, frequenta o Vale desde pequena e de lá nunca mais saiu. "Quando eu atingi uma idade 'mais crítica', decidi que ficaria no Vale. Ele foi e ainda é o lugar no qual eu me encontro", diz. A Doutrina, para ela, é algo mágico: "É sublime poder afirmar que você pode transformar o mundo só usando o seu coração e exercendo a caridade, colocando realmente em prática os pilares da Doutrina (amor, humildade e tolerância)".
Maria Clara coloca que no Vale não se distingue ninguém por classe social, raça ou gênero. Lá, você pode ser quem você quiser, a sua personalidade é sempre respeitada e a Doutrina é totalmente acolhedora. Infelizmente, indo na via contrária aos braços que acolhe, a Doutrina não é muito bem "recebida" por algumas pessoas devido ao preconceito"Geralmente quem é do Vale sempre ouve que se trata de rituais realizados para prejudicar os outros, que não é de Deus, que 'só Jesus salva'... Como se não trabalhássemos na linha do amor ao próximo".

Diógenes

Um pedagogo de 36 anos que desde os 9 frequenta a doutrina e que faz parte da equipe da recepção no Vale do Amanhecer, responsável por receber e ajudar as pessoas que precisam de algum apoio dentro do Templo. Antes de frequentar o templo, o Diogenes ia ao centro espírita em Sobradinho frequentado por sua família. No entanto, uma vez ao ir com sua mãe até o Vale do Amanhecer, lugar que ela frequentava e onde havia se casado, ele se sentiu muito atraído pelas atividades que viu e decidiu a partir de então frequentar e seguir a Doutrina do Vale.
Desde então, o Diogenes é um seguidor devoto da Doutrina, passou por várias fases até conquistar todo o conhecimento que ele possui hoje. Ele vê a doutrina como algo bem livre e enxerga que a dedicação à ela vai da consciência de cada um. Hoje, Diogenes sente-se muito bem por caminhar nessa doutrina e comenta com brilho nos olhos: "como é bom se dedicar a um princípio cristão, uma religião, seja ela qual for".

Vilela

Vilela, antigo morador de Taguatinga, era um jovem rapaz de 19 anos quando conheceu o Vale do Amanhecer. Tia Neiva buscava alguém para retratar as entidades da Doutrina, e ele foi contratado para isso. A identificação entre os dois foi tão forte que o jovem estudante de publicidade resolveu largar a faculdade e se mudar para o Vale. "Não havia uma justificativa lógica para a gente, eu assimilava com muita facilidade o que ela queria transmitir e depois retratava".
No Vale, Vilela não só se encontrou espiritualmente como também profissionalmente. Mesmo com as objeções da família, ele se mudou e desde então trabalha com o que ele sempre quis: a pintura. Há 38 anos ele dedica o seu trabalho à Doutrina como ilustrador pictopsicográfico. Hoje, Vilela possui 93 exposições, 33 prêmios de pintura e alguns livros publicados. Uma trajetória da qual se orgulha.

Jefferson

Hoje dono de uma Lan House no Vale do Amanhecer, Jefferson que chegou no Vale em 2005, por meio de um vizinho. Ele que veio de uma família católica apostólica romana, tem parentes evangélicos e desde a infância cresceu na igreja católica. Fez a eucaristia, e sempre teve vontade de ser padre. Mas com o passar do tempo percebeu que estava faltando alguma coisa dentro dele, ele não se sentia bem e a igreja não conseguia preencher o vazio dentro dele.

"Antes eu achava que o Vale do Amanhecer era um lugar para realizar rituais afim de prejudicar outras pessoas, eu só conhecia pelo que os outros me falavam, eu não conhecia a outra face do Vale do Amanhecer, eu fui conhecer quando visitei ele. Me deslumbrei com o mundo novo com aquelas vestimentas, e quando eu entrei eu senti que fazia parte daquela doutrina. E quando eu comecei o meu desenvolvimento foi quando eu comecei a tomar consciência de que existia vida após a morte, que existia um grau de evolução físico e pós o físico. Porque muitas religiões ou você é bom e vai pro céu, ou você é mal e vai pro inferno. E dependendo do que você faz entre esses dois mundos você vai pro purgatório."
Hoje ele é apaixonado pela doutrina, e pelos ideais que ela oferece.
Como foi falado no início, o Vale do Amanhecer é um lugar que vale muito a pena entender e conhecer melhor. Se você chegou até essa parte do texto, é por que você conseguiu abrir seu coração à proposta, desconstruindo conceitos prévios, conhecendo algumas das pessoas por trás da doutrina e entendendo melhor a fé que rege tantas pessoas. Fica o convite então pra passar isso adiante e contribuir com sua parte nesse processo de desmistificação do Vale do Amanhecer e claro, se quiser saber mais, o Vale possui uma recepção com pessoas designadas para te receber e conversar com você. Seja bem-vindo.
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*Informações complementares retiradas do livro Símbolos na Doutrina do Vale do Amanhecer, publicado em 2009 pela editora Tia Neiva Publicações Ltda. Autora: Carmem Lúcia Zelaya
*Curadoria de informações: João Vitor Elias Fernandes, Lígia Braga, Maria Louiza Oliveira, Maria Luiza Fialho, Milleny Cordeiro. [Estudantes de Comunicação da Universidade de Brasília - cursando a matéria de Comunicação Comunitária]
*Imagens de acervo pessoal
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