sexta-feira, 8 de abril de 2016

Atmosfera Espiritual da Terra



"Ensina o Espiritismo que os Espíritos constituem a população invisível do globo, estão no espaço e entre nós, vendo-nos e nos acotovelando incessantemente, de tal sorte que, quando nos julgamos sós, constantemente temos testemunhas secretas de nossas ações e de nossos pensamentos. Isto pode parecer aborrecido para certas pessoas, mas desde que assim é, não se pode impedir que assim seja. Cabe a cada um fazer como o sábio que não teria medo que sua casa fosse de vidro. Sem nenhuma dúvida é a esta causa que se deve atribuir a revelação de tantas torpezas e malfeitos, que se pensava enterrados na sombra.

Além disso sabemos que, numa reunião, além dos assistentes corporais, há sempre auditores invisíveis; que sendo a permeabilidade uma das propriedades do organismo dos Espíritos, estes podem achar-se em número ilimitado num dado espaço. Muitas vezes nos foi dito que em certas sessões eram em quantidades inumeráveis. Na explicação dada ao Sr. Bertrand, a propósito das comunicações coletivas que ele obteve, foi dito que o número dos Espíritos presentes era tão grande, que a atmosfera estava, por assim dizer, saturada de seus fluidos. Isto não é novo para os Espíritas, mas talvez não tenham sido deduzidas todas as consequências.

Sabe-se que os fluidos que emanam dos Espíritos são mais ou menos salutares, conforme seu grau de depuração. Conhece-se o seu poder curativo em certos casos e, também, seus efeitos mórbidos de indivíduo a indivíduo. Ora, desde que o ar pode ser saturado desses fluidos, não é evidente que, conforme a natureza dos Espíritos que abundam em determinado lugar, o ar ambiente se ache carregado de elementos salutares ou malsãos, que devem exercer influências sobre a saúde física, assim como sobre a saúde moral? Quando se pensa na energia da ação que um Espírito pode exercer sobre um homem, é de admirar-se da que deve resultar de uma aglomeração de centenas ou de milhares de Espíritos? Esta ação será boa ou má conforme os Espíritos derramem num dado meio um fluido benéfico ou maléfico, agindo à maneira das emanações fortificantes ou dos miasmas deletérios, que se espalham no ar. Assim se podem explicar certos efeitos coletivos, produzidos sobre massas de indivíduos, o sentimento de bem-estar ou de mal-estar, que se experimenta em certos meios, e que não têm nenhuma causa aparente conhecida, o entusiasmo ou o desencorajamento por vezes, a espécie de vertigem que se apodera de toda uma assembleia, de toda uma cidade, mesmo de todo um povo. Em razão do seu grau de sensibilidade, cada indivíduo sofre a influência dessa atmosfera viciada ou vivificante. Por este fato, que parece fora de dúvida e que, ao mesmo tempo a teoria e a experiência, nós achamos nas relações do mundo espiritual com o mundo corporal, um novo princípio de higiene, que, sem dúvida, um dia a ciência fará entrar em linha de conta.

Podemos, então, subtrair-nos a essas influências que emanam de uma fonte inacessível aos meios materiais? Sem nenhuma dúvida. Porque, assim como saneamos os lugares insalubres, destruindo a fonte dos miasmas pestilentos, podemos sanear a atmosfera moral que nos cerca, subtraindo-nos às influências perniciosas dos fluidos espirituais malsãos, e isto mais facilmente do que nos podemos escapar às exalações pantanosas, pois depende unicamente de nossa vontade e aí não estará um dos menores benefícios do Espiritismo, quando for universalmente compreendido e, sobretudo, praticado.

Um princípio perfeitamente constatado por todo Espírita, é que as qualidades do fluido perispiritual estão na razão direta das qualidades do Espírito encarnado ou desencarnado; quanto mais elevados forem os seus sentimentos, e desprendidos das influências da matéria, mais depurado será o seu fluido. Conforme os pensamentos que o dominam, o encarnado irradia fluidos impregnados desses mesmos pensamentos, que os viciam ou os saneiam, fluidos realmente materiais, posto que impalpáveis, invisíveis aos olhos do corpo, mas perceptíveis pelos sentidos perispirituais e visíveis pelos olhos da alma, pois impressionam fisicamente e afetam aparências muito diferentes para os que são dotados de visão espiritual.

Pelo só fato da presença dos encarnados numa assembleia, os fluidos ambientes serão, pois, salubres ou insalubres, conforme os pensamentos dominantes forem bons ou maus. Quem quer que traga consigo pensamentos de ódio, de inveja, de ciúme, de orgulho, de egoísmo, de animosidade, de cupidez, de falsidade, de hipocrisia, de murmuração, de malevolência, numa palavra, pensamentos colhidos na fonte das más paixões, espalha em torno de si eflúvios fluídicos malsãos, que reagem sobre os que o cercam. Ao contrário, na mesma assembleia em que cada um só trouxesse sentimentos de bondade, de caridade, de humildade, de devotamento desinteressado, de benevolência e de amor ao próximo, o ar é impregnado de emanações salubres, em meio às quais se sente viver mais à vontade.

Agora se se considerar que os pensamentos atraem os pensamentos da mesma natureza, que os fluidos atraem os fluidos similares, compreende-se que cada indivíduo traga consigo um cortejo de Espíritos simpáticos, bons ou maus, e que, assim, o ar seja saturado de fluidos em relação com os pensamentos que predominam. Se os maus pensamentos forem em minoria, não impedirão que as boas influências se produzam, pois estas os paralisam. Se dominarem, enfraquecerão a radiação fluídica dos bons Espíritos ou mesmo, por vezes impedirão que os bons fluidos penetrem nesse meio, como o nevoeiro enfraquece ou detém os raios do sol.

Qual é, pois, o meio de se subtrair à influência dos maus fluidos? Esse meio ressalta da própria causa que produz o mal. Que se faz quando se reconhece que um alimento é nocivo à saúde? Rejeita-se-o, substituindo-o por um alimento mais são. Desde que são os maus pensamentos que enquadram os maus fluidos e os atraem, há que se esforçar para só os ter bons, repelir tudo o que é mau, como se repele um alimento que nos torna doentes; numa palavra, trabalhar por seu melhoramento moral e, para nos servirmos de uma comparação do Evangelho, “não só limpar o vaso por fora, mas, sobretudo, limpá-lo por dentro.”



Melhorando-se, a humanidade verá depurar-se a atmosfera fluídica em cujo meio vive, porque não lhe enviará senão bons fluidos, e estes oporão uma barreira à invasão dos maus. Se um dia a Terra chegar a não ser povoada senão por homens que, entre si, praticam as leis divinas do amor e da caridade, ninguém duvida que não se encontrem em condições de higiene física e moral completamente outras que as hoje existentes.

Sem dúvida o tempo ainda está longe; mas, enquanto se espera, essas condições podem existir parcialmente; e é às assembleias espíritas que cabe dar o exemplo. Os que tiverem possuído a luz serão tanto mais repreensíveis quanto terão tido em mãos os meios de se esclarecer. Incorrerão na responsabilidade dos retardamentos que seu exemplo e sua má vontade tiverem trazido ao melhoramento geral.

É isto uma utopia? uma declamação vã? Não: é uma dedução lógica dos mesmos fatos que o Espiritismo revela a cada dia. Com efeito, o Espiritismo nos prova que o elemento espiritual, que até o presente tem sido considerado como a antítese do elemento material, tem com esse último uma conexão íntima, de onde resulta uma porção de fenômenos inobservados e incompreendidos.

Quando a ciência tiver assimilado os elementos fornecidos pelo Espiritismo, ela aí colherá novos e importantes elementos para o próprio melhoramento material da humanidade. Assim, diariamente vemos alargar-se o círculo das aplicações da doutrina, que está longe, como alguns ainda pensam, de se restringir o pueril fenômeno das mesas girantes e outros efeitos de pura curiosidade. Realmente o Espiritismo não tomou o seu impulso senão no momento em que entrou na via filosófica. É menos divertido para certas pessoas, que nele apenas buscam uma distração, mas é melhor apreciado pelos pessoas sérias, e o será ainda mais, à medida que for melhor compreendido em suas consequências.

Fonte: Revista Espírita, 1867, Allan Kardec.

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