terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

MENSAGEM DE UM AMIGO



“Eu estava distraída quando percebi a chegada de um amigo, de uma pessoa que passou aqui pelo Vale e que teve apenas dois ou três contatos comigo.

- Ó, Tia, que bom lhe ver! Depois de tanto tempo, Tia, só agora me é possível  ouvi-la. Passei muitos dias sentindo a sua presença, o seu amor,  porém sem vê-la. Por quê, Tia?

- Porque você está em um plano e eu estou em outro!

- Mas o seu plano não é Universal, Tia? A senhora não é clarividente? Os clarividentes não penetram até a terceira dimensão?

- Sim, meu filho - falei - a minha “transvisão” ultrapassa realmente as barreiras, mesmo as ditas intransponíveis...

- Tia querida, está me ouvindo, e isto é tudo! Como é bom lhe ver e lhe ouvir. A senhora sabe de tudo que aconteceu comigo!...

- Não, meu filho, muitas vezes participo de tudo, vou ao socorro dos enfermos e, quando volto ao corpo, não desperto, a não ser em casos que exigem seguidamente minha presença. O que aconteceu com você é um caso demasiadamente comum e, graças a Deus, não houve necessidade para me despertar, despertar a minha mente quando volto ao corpo.

- Preciso desabafar, querida Tia. Preciso lhe contar toda a minha trajetória.

- Eu sei, meu filho, que vai lhe fazer muito bem. Está na mente dos Doutrinadores e médiuns Aparás (sensitivos). Salve Deus, meu filho! Pode começar. Tire os últimos resíduos da Terra, e que neste instante seja levado até aos Encantados e entregue aos Iniciados o mantra de sua vida!

- Salve Deus, Tia! Foi tudo tão maravilhoso... Eu estava com aquele problema cardíaco que a senhora sabia quando fui lhe consultar. Mal me punha de pé, estava sempre seguro no ombro de Dulce, me equilibrando das tonteiras e com pontadas dolorosas na coluna.

A senhora, para me aliviar, me disse que eu nada tinha, que era um problema espiritual, muita mediunidade incubada, e me mandou falar com Pai Jacó.

Pai Jacó me disse palavras de conforto, belas palavras, e depois me disse que meu caso era de internamento.

Fiquei três dias na pensão do Edivaldo, de quarta-feira a sábado. No sábado, fui procurar Pai Jacó e ele novamente me falou que meu problema era espiritual e que na freqüência dos meus Retiros haviam se libertado três elítrios.

E, realmente, eu já caminhava sozinho, vinha buscar minha água de Pai Seta Branca, e subia sozinho até a pensão do Edivaldo. Recebi muito carinho do Alencar, palestrei com o Eurides. Ele me contou como veio parar aqui no Vale do Amanhecer e da sua dedicação à senhora, também.

Estranhei a atitude de Pai Jacó em me mandar de volta ao hospital, porque eu estava tão bem como nunca. Dulce, minha companheira,  estava satisfeita, pois nunca me vira tão bem como eu estava me sentindo.

Os dias que permaneci aqui no Vale me abriram uma nova perspectiva. Comecei a me preocupar com as coisas que não havia feito, com as oportunidades que tive em mãos para fazer o Bem e, no entanto, deixei de fazê-lo!

Graças a Deus, nunca fiz mal a ninguém. Sim, conscientemente, nunca fiz mal a ninguém. Senti que era outro homem, com novas forças, com as forças do Bem brotando dentro do meu coração!

Comecei, então, a pensar na morte como um alívio. Lembrei-me de que eu e Dulce, minha mulher, nunca tivemos um filho e nunca tive coragem para adotar uma criança, o que era o grande desejo de Dulce. Lembrei-me, também, de uma mulatinha, uma mulherzinha que havia se prostituído e fizera tudo para nos dar uma filhinha, e eu não aceitei. Dulce chorou muito por causa de minha intransigência. Com a minha doença, ela se dedicou inteiramente a mim.

Porém, senti que a havia magoado, pois ela apegou-se à família e queria sempre voltar para o Rio. Eu era um sargento reformado. Senti que minha missão com a família de Dulce já havia terminado. Depois de minha permanência no Vale eu pensava que, com a minha morte, Dulce voltaria para o seio de sua família, e tudo ficaria bem.

Comecei a ver o meu egoísmo: ficava bom para ela, como aconteceu realmente!

Seguindo as palavras de Pai Jacó, embora sem saber a razão de me internar pois me sentia tão bem, saí no domingo do Vale e fui para casa. Comecei a passar mal. Foi horrível, só tendo alívio quando sentia a presença de Pai Jacó ou tomando a água de Pai Seta Branca. De segunda para terça eu me internei no Hospital das Forças Armadas.

Ah, Tia, que beleza! Foi tudo tão fácil! Senti uma forte dor na nuca, que foi se acentuando, e, por  último, uma dor no peito. Eu fui ficando leve, leve, leve... Comecei a fazer força para me deitar. Pensei: estou no Vale do Amanhecer. Comecei a mentalizar aquela confusão, enquanto me sentia cada vez mais leve, até que ouvi minha mulher chamando a enfermeira, dizendo: ele está morrendo, ele está morrendo!...

Não sei por quanto tempo ouvi essas palavras de desespero. Comecei a ter medo, até que entrei em transe. Naturalmente, a minha mente entrou no nível etérico, onde fui prestar as contas com o meu corpo. Eu, que até então estava leve, comecei novamente a pesar, sentindo o calor dos fluídos maléficos do meu corpo.

Comecei, então, a me lembrar dos trabalhos de Pai Jacó. E o que poderia estar acontecendo comigo? Comecei a me ver andando para a pensão do Edivaldo, com uma garrafa de água fluidificada, ouvindo Pai Jacó me dizer: “Você já perdeu muito tempo... Vá para o hospital se tratar e venha fazer a caridade!” 

Pensava no jovem aparelho de Pai Jacó (Gomes), que já havia feito tanta caridade. No entanto, eu, com 58 anos, nada fizera! Tudo era suave, como se nada de mais houvera acontecido. E as visões foram se apagando. Por mais que fizesse força, nada via e nada sentia, nem mesmo dores que me dessem algum sinal do que estava acontecendo. Era como se estivesse dentro de um avião parado no espaço. Não tenho noção de quanto tempo durou esta operação. E quando me vi em outra situação, numa rica e hospitaleira mansão, estava sozinho, inteiramente sozinho!

Estava envolvido por uma grossa neblina, a poucos passos de mim, num ambiente todo coberto por uma luz lilás, cuja intensidade variava de conformidade com minha mente. Não tenho noção do tempo.

De repente, alguém me chamou pelo nome. Importante: não era o meu nome, porém eu sabia que era eu! Um nome completamente diferente. Começaram os primeiros fenômenos. Enquanto esse homem falava (a voz era masculina), a névoa ia se desmanchando, clareando, passando do lilás escuro para lilás mais claro. O som de belíssimos sermões mântricos foi firmando minha mente no encanto daquelas palavras. Senti balançar o meu corpo de coisas que havia feito. De quando em vez pensava estar sonhando um lindo sonho. De quando em vez, voltava à realidade. Ora sentia saudade, ora sentia desejos de vícios diversos.

A paisagem mudava de acordo com meus pensamentos. Fui, então, me conscientizando dos fatos. O sermão continuava, dizendo coisas de que nunca me esqueci: “Homens endurecidos! Penetrem em seus corações e examinem as suas consciências. Vejam o que é possível fazer. Permanecerão sete dias dentro das suas próprias consciências. Não terão desejos. Depois, então, voltarão com as suas mentes à Terra e de lá partirão para onde lhes aprouver.”

Fiz um esforço muito grande querendo dizer: Onde estou? Qual é a minha condição? Mas minha voz não saía. Porém, tive resposta: “Terás que permanecer aqui ainda por mais noventa e seis horas. Dentro de ti entenderás melhor. O Homem vive na Terra a volúpia dos seus dias... Sua única preocupação é com sua própria segurança material, esquecendo-se da verdadeira missão, do que foi fazer realmente. Na Terra, o Homem vem para restituir o que destruiu. O Homem não tem forças para chegar aos mundos superiores enquanto sua mente estiver sob o peso da destruição que causou!”

De fato, Tia, tentei me levantar de Pedra Branca, de onde estava, mas acredito que nem o super-homem o conseguiria. Foi então que me passaram pela mente minhas faltas, na concentração daqueles dias. Senti imensa frustração pelo que havia feito. Interessante, Tia, que eu não senti tanto pelo que fiz, mas, sim, pelo que deixei de fazer. Quantas pessoas a quem deixei de ajudar, e as quais desprezei!

Ia deixar, agora, a Pedra Branca, porque foram sete dias dentro de mim mesmo. Em todas as minhas orações me lembrava de Pai Jacó e de seu aparelho; a todo instante tinha a impressão que ele chegava ali. Durante estes sete dias, ninguém vi e nada senti. Somente tinha respostas do que eu pensava.

Lembrei-me, também, da minha pobre Dulce. Tudo isso, porém, eram lembranças longínquas. Minha preocupação era, realmente, com as coisas que não fizera, que passaram por mim e eu deixara de fazer.  Lembrei de José, um subalterno que teve tanta necessidade de mim e a quem não ajudei, por quem nada quis fazer.

Eis que chegou a hora de sai dali. De repente, tudo se modificou: achei-me numa grande rodoviária, iluminada pelo mesmo clarão lilás. Vi saírem pessoas com diversos destinos, sem saber para onde.

Foi quando ouvi uma voz de comando superior ao nosso plano ali: “Destino para a Terra! Equilibrem-se para a viagem!” Levei o meu pensamento imediatamente ao Vale do Amanhecer. A voz de comando avisou a chegada na Terra.

Cheguei pela manhã, Salve Deus! Parecia que havia chovido, porém, Tia, não tenho muita certeza. Comecei a enxergar com dificuldade e as coisas mudavam conforme meus pensamentos. Mudavam, porém nunca saiam daquele lilás baço, mais claro ou mais escuro. Senti muita saudade e pelejava para saber quem era eu realmente.  Se alguém perguntasse meu nome, passaria vexame, pois não sabia!

Ouvi tocar a sirene e me lembrei de Edivaldo. Fui até lá, mas não enxergava direito. Ele passou por perto de mim e segurei o seu braço, balbuciando alguma coisa. Ele não me atendeu. Tocou a sirene outra vez. Eu voltei e entrei no Templo, indo parar na mesa branca.

Enxerguei luzes, muitas luzes, que desapareceram de repente, ficando novamente a luz lilás. Olhei aqueles médiuns ali sentados e não vi Pai Jacó. E antes que pensasse, senti um forte safanão e fui atirado em um aparelho, um homem. 

Comecei a chorar com todas as minhas forças. Meu Deus! Onde estou, para onde irei? - pensava. Essas perguntas me torturavam e fiquei irritado. Dei um grito. Um Doutrinador me explicou: “Que tens, irmão? Calma! Este corpo não é seu. Comporte-se direito...” Senti uma grande vergonha e voltei a chorar.

O Doutrinador continuou: “Quando estavas neste mundo, nada fazias. Agora, precisas saber que este corpo não é teu.” Quis dizer: Pai Jacó me proteja, pelo amor de Deus! Então, me aconteceu um fenômeno: Ouvi Pai Jacó me dizendo: “Filho, estás com Deus! Se receberes a doutrina desses médiuns, que estão te dando esta oportunidade, partirás para outros mundos!”

Aquelas palavras foram caindo em mim como o orvalho cai sobre a flor. Pai Jacó, meu paizinho, não me desampare! Enquanto eu me preparava, o médium se contraía pelos maus fluidos da desencarnação recente, que hoje eu entendo tão bem! De repente, me desprendi dos meus benfeitores e passei pelo processo da verdadeira desintegração. Fui jogado para uma estufa que se ligava aos meus benfeitores. Saí e, então, avistei uma cidade diante de meus olhos. Foi quando me dei conta de que havia morrido! Comecei a sentir saudade de minha pobre Dulce e a me preocupar.

Não sei por quanto tempo durou esta situação. Fui internado em um hospital e lá começaram meus conflitos. Ficava a olhar tudo quanto podia ver, maravilhado, porém com uma angústia terrível.

Sofria profunda insatisfação ou a falta de algo, de alguma cousa que deixara de fazer. Pensei que sentia falta da Dulce. Pedi ao meu Mentor que me levasse até onde ela estava, e fui. Porém, me senti tão inútil! Perseguiam-me as recordações do cabo José, da criança que eu deixara de adotar...

Pedi ao meu Mentor que me desse uma nova missão, porque aquela já estava perdida. Pedi para voltar imediatamente.

Estava de volta quando me deparei com o cabo José no mesmo plano meu. Fui correndo ao encontro dele, chamando-o como um desesperado, e, por duas vezes, ele virou-me o rosto! Continuei e parei à sua frente dizendo: “Não sabia que você havia morrido!” “Como? Como não sabia? Eu lhe havia dito que estava com pneumonia e precisava de um internamento. O senhor me virou as costas e, ainda mais, mandou que eu seguisse em frente! Não agüentei, e uma forte hemoptise me fez cair ali mesmo, esvaindo-me em sangue.”

Meu Deus! Caí de joelhos diante do cabo, pedindo-lhe perdão. Oh, Tia Neiva, foi horrível! Ele virou-me as costas e desapareceu numa fila enorme. Meu Deus! Não fui apenas malvado, porém muito pior, fui desumano, não existindo amor em meu coração. E aqui estou, sofrendo angústias e frustrações pela missão perdida.

Fui ao Ministro pedir uma nova oportunidade para voltar à Terra, e foi mais um vexame por que passei. Os Mentores me negaram, dizendo que ficaria para resolver o que realmente me restava fazer!”

Tia Neiva, 30 de novembro de 1975

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