terça-feira, 22 de janeiro de 2013

DR. Sousa Martins


Farmacêutico, Médico (Santo?): 1843 – 1897  

 


Sousa Martins
A morte não é mais forte do que eu...

QUANDO TUDO ACONTECEU...
1843:  Em Alhandra, vila à beira-Tejo, a uns 25 quilómetros de Lisboa, nasce José Tomás de Sousa Martins.1856: Passa a praticante na Farmácia Ultramarina, em Lisboa. 1864: Alcança notável classificação em Farmácia, 1866: Brilhante licenciatura em Medicina. 1869: Demonstrador da Secção Médica da Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa. 1874: Médico extraordinário do Hospital de São José. No mesmo ano é nomeado membro benemérito da Sociedade Farmacêutica Lusitana pela sua brilhante actuação como representante de Portugal no Congresso Internacional de Viena “Quarentenas e Medidas Sanitárias”1876:Na Escola Médica é catedrático de Patologia Geral, Semiologia e História da Medicina. 1888: É um dos fundadores do Club Hermínio que se propõe levantar casas de saúde na Serra da Estrela. 1897: Participa naConferência Sanitária de Veneza, e ali sente-se mal, já está contagiado pela tuberculose. Morte de Sousa Martins.


CAMPO DE SANTANA 


Estátua de Sousa Martins
Em Lisboa, no Campo de Santana (mais tarde chamado Campo dos Mártires da Pátria) cercada de montes de flores, de velas acesas e de placas de mármore gravadas com agradecimentos e homenagens (ex-votos), frente à Faculdade de Medicina está implantada a estátua do Dr. Sousa Martins, obra do escultor Costa Mota, Perto, localiza-se o quiosque da D. Orlanda, florista cabo-verdiana. Todos os dias ela deposita um ramalhete junto aos pés da estátua, Provoco:

- Mas que gentileza é essa, ó D. Orlanda? Olhe que esse aí nem sequer era preto...

Devolve:

- Ele é preto, ele é branco, ele é tudo, ele é santo.

Fico atordoado: passado mais de um século, o médico Sousa Martins continua a cativar devotos? Sinto-me envolvido pela sua história, sugado pela sua vida, arpoado pelo culto popular que lhe é prestado em Lisboa (Campo de Santana), em Alhandra e na cidade da Guarda. Culto aliás abjurado pela Igreja Católica, depois veremos por que motivo.

FARMÁCIA ULTRAMARINA

Elevador da Bica

A 7 de Março de 1843, em Alhandra, vila a dois passos de Lisboa, a doméstica Maria das Dores dá a luz um menino que é baptizado com o nome de José Tomás de Sousa Martins. Caetano Martins, carpinteiro, pai de José Tomás, morre quando o garoto tem apenas sete anos. Maria das Dores, sozinha, toma conta do filho até ele completar a Instrução Primária. Só então pede ajuda ao seu irmão Lázaro, que vive em Lisboa e ali é dono da Farmácia Ultramarina,
Lázaro recebe o sobrinho em sua casa, matricula-o no Liceu Nacional e convence-o a praticar na farmácia.
Seduz-me cotejar o que já lá vai com o meu presente. Em Lisboa alcanço o Largo do Chiado e, logo a seguir, as duas igrejas, uma frente à outra, a do Loreto e a da Nossa Senhora da Encarnação. Atravesso a Rua da Misericórdia, cruzo o Largo Camões e sigo pela Rua do Loreto. Mais uma centena de metros e arribo ao Largo do Calhariz, Daqui parte, ladeira abaixo, o Elevador da Bica. Embarco. Talvez uns dois minutos para chegar ao fim da linha. Desço. Estou na Rua de São Paulo, frente à Farmácia Ultramarina. Mas não vejo o Sousa Martins, não posso vê-lo, apagou-se há mais de um século. Porém um golpe de imaginação e vislumbro que o rapazinho está ali a manipular produtos naturais, com rigor e entusiasmo, sempre.

CURSOS


 
Concluído o curso liceal em 1861, Sousa Martins faz a admissão à Escola Politécnica de Lisboa e dali salta para a Escola Médico-Cirúrgica.
A seguir matricula-se em Farmácia, junção de cursos.
Em 1864, com apenas 21 anos, obtém notável classificação final em Farmácia, Para alguma coisa valeu o muito que praticara com o seu tio Lázaro.
Em 1866, com 23 anos, conquista brilhante licenciatura em Medicina.
Diplomas e conhecimento profundo, armado está Sousa Martins.

TORRENTE


Hospital de São José



Afoito, vejo que nada pela vida fora.
Atira-se de cabeça, mergulha. Ainda em 1864 é nomeado sócio efectivo da Sociedade Farmacêutica Lusitana.
Dá quatro braçadas a favor da corrente. Em 1867 é nomeado Sócio Correspondente da Academia Real de Ciências (de Lisboa),
Evita um escolho. Em 1868 vai a concurso e é chamado para demonstrador da Secção Médica da Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa.
Mergulha, sustem a respiração. Em 1874 é convidado para médico extraordinário do Hospital de São José.
Contorna um promontório, Ainda em 1874 é nomeado membro benemérito da Sociedade Farmacêutica Lusitana pela sua brilhante actuação como representante de Portugal no Congresso Internacional de Viena “Quarentenas e Medidas Sanitárias”.
Exausto, embora tranquilo, aproxima-se da meta. Em 1876 a Escola Médica convida-o para leccionar as cátedras de Patologia Geral, de Semiologia (estudo dos sintomas das doenças) e da História da Medicina.

MÉDICO E DOENTES

Sousa Martins e a sua bondade sempre a jorrar. Entretanto, o que está a acontecer no resto do mundo? Consulta a TÁBUA CRONOLÓGICA.

Orações ao Dr. Sousa Martins

Com o seu diagnóstico certeiro e célere, em cada mês Sousa Martins consegue atender um rancho alargado de pacientes. 
A sua bondade, que não pára de jorrar, incita os doentes a guindá-lo a santo milagreiro. Até lhe dirigem orações. Eis uma, entre as centenas recolhidas:
Nada me alegra tanto 
Como ouvir-Te 
Sussurrar como devo 
Encaminhar 
Os meus passos. 
Só pensando em Ti 
Consigo 
Caminhar na vida. 
Obrigado Dr. Sousa Martins
Eis outra: 
Dr. Sousa Martins, 
Ajuda-me a não desistir 
Quando as dificuldades 
São muitas 
E os escolhos são enormes 
Mas o caminho está certo 
E tenho de prosseguir. 
Ajuda-me, Dr. Sousa Martins, 
Eu quero vencer na vida.
E ainda uma terceira:
Este louco coração
Corre como um cavalo 
Sem freio 
E atinge níveis descomunais.
Para o acalmar
Dou-lhe alfazema ou erva-cidreira
E ela abranda
Tal como disseste.
Obrigado, Dr. Sousa Martins.
E uma quarta:
Falta me a luz 
Para entender
Como hei de proceder
Tento tudo
Mas tudo sai errado
E é cada vez mais complicado.
Por favor,
Ajuda me, Dr. Sousa Martins.
E ainda:
Tudo me mete medo
Não sou capaz de arriscar 
Mais do que vejo 
À frente dos meus olhos. 
Só passo a passo
Consigo avançar
 
E mesmo assim hesito 
Em tudo quanto faço. 
Dr. Sousa Martins 
Diz-me como hei de proceder 
E este medo perder 
Para ser igual 
A toda a gente feliz. 
Ajuda-me Dr. Sousa Martins.
José Tomás de Sousa Martins debruça-se, fundamentalmente, sobre os pobres e desprotegidos, sobre os espezinhados nesta vida porque ele, apesar de se dizer maçon, acredita que há outras para além daquela que ora estamos a percorrer.
Para ele, a alma, o espírito, será portanto um pássaro sempre em busca de um ninho mais acolhedor. Os coitados que estão para ali à espera do fim, mais tarde irão reencarnar, umbral distante mas que um dia será alcançado.
Adverte:
- Quando entrardes de noite num hospital e ouvirdes algum doente gemer, aproximai-vos do seu leito, vede o que precisa o pobre enfermo e se não tiverdes mais nada para lhe dar, dai-lhe um sorriso.

AMORES
 Serra da Estrela






























Ex-votos para o Dr. Sousa Martins



Vários amores porém Sousa Martins não casa, coração excessivo para aturar uma rainha absoluta.
TUBERCULOSE
Em Lisboa, doença epidémica é a tuberculose pulmonar. Os antibióticos ainda não existem e Sousa Martins acha que só a climoterapia pode enfrentar essa terrível doença. Ou seja: é urgente deslocar para lugares altos como a Serra da Estrela e a cidade da Guarda, os doente atingidos pelo bacilo de Koch.
Com o apoio da Sociedade de Geografia de Lisboa, Sousa Martins, o geógrafo Brito Capelo e o médico Basílio Freire da Universidade de Coimbra, em 1888 estruturam o Club Hermínio, fundação que se propõe levantar várias casas de saúde na Serra da Estrela. A primeira a ser construída é nas Penhas da Saúde, local assim denominado porque ali vão pousar os que sofrem de doenças respiratórias.
Apesar das promessas da Coroa o sanatório da Guarda é que tarda a ser erguido.

SUICÍDIO

Em 1897 Sousa Martins participa na Conferência Sanitária de Veneza, onde é eleito vice-presidente, Durante os trabalhos sente-se mal, mordido já está pela tuberculose, contágio dos seus pacientes,
Quando chega a Lisboa logo trata de partir para a Serra da Estrela, em busca de alívio,
Ao sentir-se melhor regressa a Alhandra e ali instala-se na quinta de uns amigos.
Diagnóstico: tuberculose e lesão cardíaca!
Diz para um colega:
- A morte não é mais forte do que eu,
E sussurra para outro:
- Um médico ameaçado de morte por duas doenças, ambas fatais, deve eliminar-se por si mesmo.
É o que ele faz em 18 de Agosto de 1897, injecta-se, overdose de morfina. 54 anos, vida curta, porém ardente,
Diz El-Rei D. Carlos I de Portugal:
- Sousa Martins, ao deixar o mundo, chora-o toda a terra que o conheceu. Foi uma perda irreparável, apagando-se com ele a maior luz do meu reino.
A Rainha D. Amélia trata de apressar a construção do Sanatório Sousa Martins na cidade da Guarda.
Diz o poeta Guerra Junqueiro:
- Eminente homem que radiou amor, encanto, esperança, alegria e generosidade, Foi amigo, carinhoso e dedicado dos pobres e dos poetas, A sua mão guiou. O seu coração perdoou, A sua boca ensinou. Honrou a medicina portuguesa e todos os que nele procuraram cura para os seus males.
OUTRA VEZ NO CAMPO DE SANTANA
Não me cativam as tais revoadas de ninho em ninho. Se elas seduziram o Sousa Martins, problema dele, só dele, a cada qual a sua própria intuição....
Apesar do culto popular a Igreja Católica continua a recusar a santidade a Sousa Martins porque ele foi, sem vacilar, espírita e suicida. .
Torno ao Campo de Santana. Aponto a estátua e outra vez meto conversa com a florista cabo-verdiana:
-D. Orlanda, esse aí já não é santo.
Ela benze-se e eu continuo:
- Tenha calma! Não é, mas foi. Há cem anos ele foi santo e dos grandes. É essa a homenagem que lhe presto.
Sorri, aliviada. Suspira:
- Ao menos isso, valha-nos Deus...

SALVE DEUS

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